sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009


Mistério
Emanoel Barreto

No silêncio da noite em abandono,
na pegadas dos pés que ali passaram,
eles se encontram na grande solidão,
no abraço calado do carinho.

E as sombras guardam todos os segredos.

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

Os maus e a maldade
Emanoel Barreto

O ataque de skinheads à advogada brasileira Paula Oliveira, na Suíça, demonstra o quanto a intolerância, a crueldade e a visão embrutecedora de grupos extremistas podem dar ao mundo o que há de pior no ser humano.

A agressão, perversamente requintada, assumiu aspectos do quanto há de degradante na violência: Paula estava grávida de gêmeas, perdeu as duas filhas e está com o corpo retalhado.

Vivemos um mundo em que as maravilhas da tecnologia, da medicina e da ciência chegaram a um ponto de refinamento que somente tende a crescer. A par disso, viceja a mais abjeta e furiosa expressão da maldade.

Os fundamentalismos, sejam religiosos, econômicos ou ideológicos, somente desaguam num agudo estado de espírito social onde impera o prazer em causar dor e dano. Ao que tudo indica, o processo histórico se encaminha para o recrudescimento da violência como argumento de persuasão e domínio, enquanto o Homem perde a própria noção de humanidade.

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009


Burocracia
Emanoel Barreto

Você quer soluções? Nós temos problemas.
Quer a felicidade? Temos angústia.
Busca trabalho? Oferecemos desemprego.
Deseja ser com? Transformamos você em inimigo.
É honesto? Levamos você para a corrupção.
Tem fé na humanidade? Ensinamos como destruí-la.
Acredita na perseverança? Lhe daremos preguiça.
Defende a Justiça? Nós ministramos o crime.
Paz? Fará a guerra.
Amor? Apreenderá a odiar.
Depois, estará pronto para entrar para o sistema.

terça-feira, 10 de fevereiro de 2009


O direito de morrer
Emanoel Barreto

A italiana Eluana Englaro, em estado vegetativo havia 17 anos e pivô de uma disputa que opôs o governo conservador do primeiro-ministro Silvio Berlusconi, apoiado pelo Vaticano, ao Judiciário e ao presidente da República da Itália, morreu ontem, aos 38 anos (Folha de S. Paulo).
.......
Dita assim, na fria linguagem das coisas de jornal, o drama da jovem é apenas um registro taquigráfico da vida. O caso, todavia, envolve questões éticas, emocionais e, de fundo, um aspecto a que não se pode recusar respeito: o de que alguém em estado vegetativo está passando por um profundo sofrimento, do qual talvez sequer tenha consciência.

O drama da jovem assume conotações que vão bem ao âmago da condição humana: a angústia da família, a dor de ver alguém que já foi bela, alegre e certamente cheia de sonhos, murchar, definhar lenta e dolorosamente.

Após 17 anos em tal situação, qual ser humano deveria ser obrigado a permanecer vivo? O direito de morrer, a eutanásia, deveria ser considerado, estudado e compreendido em sua amplitude. A morte pode ser a solução para uma vida que, em si, já não existia socialmente.

Viver não é apenas estar vivo: é agir, lutar, ganhar, perder, arrojar-se a empreitadas e sentir a pulsação da vida enquanto ânimo projetar-se na vida enquanto participação. Uma vida em silêncio é já uma vida morta, ausente da própria vida. A moça tinha o direito de morrer e, morrendo, resgatou a sua dignidade humana.

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

Senão, como vamos viver?
Emanoel Barreto

Vamos, vamos, vamos.
Vamos continuar matando,
destruindo casas,
arruinando esperanças,
saqueando plantas,
trucidando gente.

Vamos e vamos bem depressa,
que ainda há muito o que matar.

Vamos tragar para a escuridão
qualquer réstia,
qualquer resto,
qualquer rastro de luz.

Afinal, é preciso fazer dinheiro.
Senão, como vamos viver?