sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

Esquentai vossos pandeiros
Emanoel Barreto

Chegou a festa, a cuíca zurra sua sua cantiga bárbara, lúbrica, luxuriosa - e geme; o cavaco solta acordes finíssimos, agudos como ponta de florete; surdos marcam, profundos, o ritmo que alucina; tamborins são sopranos em ária sensual; caixas atiram-se para a frente cantando a liturgia do prazer e mulatas flertam com o desejo agarrado às suas ancas. É o Brasil em festa. É o carnaval como fascinante sagração do desvario. E os pandeiros entoam seu ritmo feiticeiro.

Chegou a festa. Somos a civilização de Baco, somos o povo feliz. Feliz por quatro dias, feliz pela ilusão criada de sermos felizes por exatamente quatro dias.

Samba, suor e cerveja são nossos deuses lascivos; com eles iremos até o fim. Até que o último arquejo licensioso se cale, até que a última gota esgote o jato libertino. Vamos ser felizes, vamos ser felizes por quatro dias.

Viva o Brasil. Viva essa alegria louca que confunde mas aplaca, que excita mas acalma, palpitando o coração por mais loucura. Viva o Brasil. Viva o carnaval. Viva a mulata que esconde nos quadris a imoderação e todas as suas delícias.

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E Walter Medeiros chega, da cavaco e tamborim.

Zé Pereira
Walter Medeiros
Português danado,
Cabra sem enfado,
Pela vida inteira.

Viva o Carnaval,
Que tanto admiro,
Mas já me retiro,
Não me levem a mal.

Viva aquele samba,
Feito por Martinho,
Que canto baixinho,
Querendo ser bamba.

Viva a lembrança,
Do pó, do confetti,
Caetano, Zé Kéti,

Serpentina e lança.
Viva Paulo Maux,
Nosso eterno Rei,
Nunca esquecerei,
Mas sei que passou.

Viva nossos clubes,
De lindo passado,
Que está gravado,
Não há quem derrube.

Viva uma saudade,
Cá neste meu peito,
De amores sem jeito,
E de felicidade.

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

O capital quer dinheiro
Emanoel Barreto

Trabalhadores e pobres do mundo inteiro estão apreensivos: o capital tem fome. Depois da farra financeira dos bancos americanos, gente que não tem nada a haver com isso está pagando a conta. Paga com desemprego, medo de perda do emprego e paga com dinheiro que o Estado encaminha às empresas para sustentar exatamente o culpado pela crise instalada: o capital.

Do mesmo modo que o chamado socialismo real apresentou a face cruel daquela formulação socialista, os fundamentalistas do mercado agora são chamados pela história a dar seu depoimento: está desfeita a máscara e o mercado mostra que não é nada daquilo que se dizia: elemento resolutivo para qualquer imprevisto econômico, agente coletivo dinâmico cujas forças internas tinham condições quase divinas para demarcar rumos.

O que se vê é uma situação mundial perversa, com o Estado sendo chamado às pressas pelas empresas a fim de lhes garantir sobrevivência. É uma espécie de chantagem: se isso não for feito, a falência do sistema levará de roldão milhões de pessoas ao desespero e estará instalado o caos total. Ou seja: é preciso salvar os muito ricos, a fim de que os pobres consigam pelo menos uma tábua de salvação - já que o transatlântico do capital não comporta ocupantes de segunda classe.

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Os podres Poderes
Emanoel Barreto

A genial charge de Angeli, na Folha, representa literalmente a perversa e monstruosa política brasileira. Câmara e Senado formam uma entidade acima, além e adversa ao ser coletivo a que chamamos povo. Muitos homens e mulheres bem remunerados, mimados por privilégios que envergonhariam a qualquer pessoa decente, trabalham ininterruptamente em proveito próprio.

Alguém dirá: "Ah! Mas não são todos." Claro que não são todos. Mas a estrutura, o cerne congressual é embolorado por outro ser também muito nosso conhecido, a corrupção e esta, de alguma forma, inclui em seu abraço largo até os bem intencionados. Corrupção aqui em sentido amplo, abrangendo decisões que beneficiam grupos, toldam direitos dos trabalhadores e enegrecem o sentido ético da política.

Quer ver? Basta lembrar as decisões partidárias que obrigam até mesmo os bons a se curvar ante interesses tenebrosos, estarrecedores. As elites e seus interesses dominam o Congresso e dele se valem como coisa própria. Daí porque a validade da charge, com alto poder de fogo editorial.

Com a intenção típica das charges, ela se utiliza do humor sátiro e corrosivo para demonstrar os podres dos Poderes. Faz-nos rir, mas faz-nos também lamentar.

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009


O lindo perigo de viver
Emanoel Barreto

Ele ali,
ante tão grande
e belo abismo.

A perplexa
manifestação
do que é viver.