sábado, 1 de agosto de 2009

Sarney pede pra sair
Emanoel Barreto

A Veja informa que Sarney começa a aplainar o terreno para deixar a presidência do Senado. Isso depois de enorme mobilização da imprensa vocalizando a opinião pública nacional. Apresentado de corpo inteiro como político corrupto, portanto indigno de ocupar não apenas a presidência da Casa, mas o cargo de senador, Sarney é a expressão mais completa da cultura da indecência que contamina plenários e gabinetes decisórios.

Mas, que ninguém se engane: tipos como ele e outros que trabalham nos escaninhos do poder não nascem do nada, não vêm "de fora" da sociedade brasileira. Antes são amostras bastante exatas da nossa própria cultura do jeitinho, das facilidades, da molícia moral que tornou-se comum em nosso dia a dia, naturalizou-se, passou a ser "normal."

Assim, não são poucos os de nós que se aproveitam de um descuido do próximo para tomar-lhe o lugar na fila; se puderem dão o troco errado ao cliente; se não encontrarem resistência, levarão para casa papel e até clips da repartição onde trabalham. Você deve conhecer algum caso.

Essa macrorrealidade migra, se espalha, abrange e termina por parir no Congresso os ratos com mandato, que irão se aproveitar do cargo para enriquecer mais e mais. Nossa cultura de hedonismo civil, de misturar o público com o privado resulta no espetáculo do Senado desgraçado sob presidência degradada.

Mas o andar da história se leva o andor dos dominantes e todas as suas taras políticas, traz também a procissão dos que não são indiferentes. Sim, é possível tirar tais indivíduos da cena política. Sim, é possível, pelo menos, começar a pensar nisso.


sexta-feira, 31 de julho de 2009


O Papa é pop

Emanoel Barreto


A Folha Online diz: O porta-voz do Vaticano, padre Federico Lombardi, confirmou hoje que a voz do papa Bento 16 estará presente em um CD de cantos, orações e músicas, que será lançado mundialmente até o Natal.

Com a declaração, a Santa Sé confirma a notícia que foi divulgada em Londres pela gravadora Geffen UK/Universal.
Segundo Lombardi, as gravações foram disponibilizadas pela Rádio Vaticana e o papa não teve nenhuma relação direta com a produtora britânica.
"A iniciativa nasceu da SanPolo Multimedia, que pediu à Rádio Vaticana alguns trechos da voz do Santo Padre para a produção de um CD", explicou o porta-voz.

De acordo com a Secretaria de Estado do Vaticano, fazem parte da produção oito trechos retirados de discursos e orações do pontífice em vários idiomas. No total, são menos de dez minutos de gravações da voz de Bento 16 que, depois, foram mixadas com as partes musicais.
A britânica Royal Philharmonic Orchestra gravará as composições clássicas nos estúdios Abbey Road, em Londres. O presidente da gravadora Geffen UK, Colin Barlow, disse que a voz do papa é "incrível".

"Nós estamos felizes que o papa Bento 16 mostrou apreciação e deu sua benção especial a esse projeto", disse Barlow. Mais detalhes do disco serão anunciados em setembro, em um lançamento oficial do projeto no Vaticano.
João Paulo 2º também realizou uma produção semelhante, o álbum "Abba Pater", lançado em 1999.

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A religião sempre teve um apelo ao espetacular. Missas, cultos dos mais diversos credos, cumprem rituais, liturgias grandiosas, procedimentos milenares e meticulosos. Há paramentos, roupagens dos sacerdotes, cumprindo-se de alguma forma uma encenação social, mesmo que pespegada de comportamento solene.

Com a midiatização da religiosidade a questão assume definitivamente a condição espetacular e funciona de maneira a traduzir catarse de problemas do cotidiano, suas angústias, indecisões, medos e limitações os mais diversos. A religião como válvula de escape, da mesma forma como acontece com o futebol como fenômeno de massa.

A voz do Papa agregada a um CD, mesmo guardadas as devidas reticências formais de seriedade e austeridade comportamental do pontífice, demonstra o quanto as religiões estão literalmente disputando esse tipo de "mercado" metafísico. A Igreja Católica é uma poderosa força milenar, que hoje vive momentos de confronto com outros credos cujas manifestações mágicas prometem a redenção na Terra, na forma de fortuna, fama e bem-estar.

Vamos ver se o marketing do Papa funciona nessa disputa.


quinta-feira, 30 de julho de 2009


32 anos sem Cascudo
Emanoel Barreto

Esta quinta marca os 32 anos da morte de Luís da Câmara Cascudo. Com ele fiz muitas entrevistas, conversas encantadoras sobre as coisas do povo, suas rezas, seus tempos arcaicos. Quando Cascudo morreu foi-se com ele todo um tempo. Mais velho que o século 20, como gostava de dizer, iluminava as tardes da Ribeira e luzia com o crepúsculo no Potengi. Eu estava na Tribuna do Norte. Antônio Melo era o editor-chefe. Na foto acima a figura imponente do Professor. A ilustração é do chargista Cláudio, hoje no Agora São Paulo. Saudades.

Sobre ele, recolhi na net o que abaixo se segue:
Você sabe que os contadores de histórias elegeram o historiador e folclorista Luís da Câmara Cascudo como protetor. A oração de "São Cascudo" faz referências ao mundo das histórias. Pare um momento e faça sua oração de hoje. “Ajude-me meu São Cascudo, / Que tem coisas nesse mundo / Que só existem nas memórias / Do povo mágico das histórias. / Quero uma lição de Geografia / Que um índio velho contaria / Para uma criança portuguesa / Se fartando com a sobremesa / De pé de moleque e brigadeiro / Junto com um peão boiadeiro. / São Cascudo, me diga o que é / Que vem de noite em um só pé, / E como me livro dessa assombração/ Meu Santo Padroeiro da Tradição. / Agora vou me deitar na rede, / Pois eu sei que o Santo entende, / Que amanhã é dia de festança / Vai ter música, aguardente e dança /Pro meu coração enamorado. /Valei-me meu São Cascudo!”

Deus virou máquina de fazer dinheiro
Emanoel Barreto

Entre perplexo e indignado vi ontem à noite, na TV, três "pastores" fazendo sentidíssimas orações quando pediam dinheiro a Deus para os fiéis de sua "Igreja". Eles estavam no mais alto ponto de uma montanha, morro, outeiro ou seja lá o que fosse. Fazia um frio de doer e os tais aparentavam contrição.

No estúdio, dois "bispos" reforçavam as orações e garantiam que uma corrente de 318 "pastores" uniria todas as suas energias espirituais para que os crentes daquele fé sanassem todas as suas dificuldades financeiras. Certamente, quando comparecerem ante os 318 sairão ungidos de notas de dólares, abrirão empresas e serão felizes para sempre.

Ao que parece, Deus não está no céu, mas na gerência de um banco...

Ao que vejo, a transformação de atos religiosos em acontecimentos de mídia, o que envolve também padres financistas, é uma espécie de sinal dos tempos. Cercada por infinidade de problemas sociais na conjuntura e na estrutura as pessoas em desespero atiram-se em direção ao divino, esperam milagres, salvação, bonança.

O resultado disso é o crescimento de seitas e igrejas midiáticas que recolhem dízimos e ganham, elas sim, muito dinheiro. Quanto aos fiéis, que continuem a rezar. Quem sabe, ganhem algo na Mega Sena.

quarta-feira, 29 de julho de 2009

A desgraça ou coisa parecida
Emanoel Barreto

A Globo anuncia mais um reality show, No Limite. Todos essses espetáculos cumprem um esquema básico: pessoas agrupadas para disputar dinheiro, numa espécie de representação da vida fora do show, onde é preciso lutar pela sobrevivência cotidiana. Só que ali, no teatro montado para a ação, o que se processa é uma sequência de conflitos, onde o ser humano se expõe e se dispõe a humilhações, angústias e degradações. Perversões, até.

E tudo apresentado como se fora a sagração da capacidade humana de se superar a realizar grandes feitos. É o glamour da indecência. O ritual da indignidade.

As pessoas são constrangidas a superar obstáculos e de alguma forma são seviciadas, abandonam-se às cruéis provas de resistência e asco. Tudo para ganhar um milhão. O número assume condição de coisa fabulosa, inacessível à maioria dos mortais por condições normais de trabalho, e funciona como ímã que torna remidas todas misérias morais a que se submetem os participantes.

Por instantes são alçados à condição de famosos e ao sofrimento se dá um certo charme doloroso, como se fossem heróis ou coisa parecida. Na verdade são desgraçados ou coisa parecida. E o show, no limite, comprova que a desonra tornou-se valor ou coisa parecida.

terça-feira, 28 de julho de 2009

A moça e a estátua trêmula
Emanoel Barreto

Depois, o frio que estava lá fora
caminhou para dentro da alma da
moça e ela se transformou em estátua
que tremia de medo de voltar a viver.

domingo, 26 de julho de 2009

A chuva e o humano gesto

A beleza, a grandeza, o mistério da chuva. Acompanhe nesse vídeo.
Abraços,
Emanoel Barreto