Felicidade não se improvisa
Há algo de estranho nessas
manifestações populares contra o aumento de preços de passagens de ônibus. O
meu estranhamento se dá em função do seguinte: o país é imerso nessa festa trôpega
da tal Copa das Confederações, realização irreal de uma felicidade coletiva. Esta,
por sua vez, se esvanece em meio à fumaça das bombas da polícia.
Colocando as coisas de outro
modo: se a felicidade fosse real, se fôssemos um povo que vivesse com
dignidade, você acha que milhares de pessoas iriam às ruas manifestar
indignação ante um aumento de míseros vinte centavos em passagens de ônibus?
Iriam as pessoas se arriscar a apanhar por tão pouco?
Claro que não. Quem reclama por
tão pouco e porque também tem muito pouco, e desse pouco não pode abrir mão.
Em meio a tudo isso emerge a condição
humana e surgem os atos de vandalismo, depredação, desordem. Está errado, mas a
essência do movimento representa um legítimo sentimento de repulsa às
desigualdades sociais. Disso não se pode abrir mão, mesmo que seja inaceitável a
desordem.
Então, o que quero dizer é o
seguinte: as elites do país precisam entender que o povo, parcela ponderável
desse povo, não está se contentando com o pão e circo tão bem expresso pela
Copa das Confederações.
Governo e elites parecem não perceber
que não podemos mais esconder as misérias do país com a empanada sonora do
circo do futebol, os gritos de gol, a felicidade da torcida alegre e bêbada.
Felicidade não se improvisa. Mas
tem gente nesse país ainda acreditando nisso. E o preço pode sem bem mais alto
que os vinte centavos de uma passagem de ônibus. Quando o povo vira turba a
culpa é de alguém que não é povo.