sábado, 26 de novembro de 2016



De como os jornais não noticiaram a morte de Fidel Castro

A manhã deste sábado, 26 de novembro, me acorda e na TV a notícia me anuncia: morreu Fidel Castro, aos 90 anos. Vi no You Tube que às duas da manhã a Globonews fizera o registro. Os jornalões impressos não fizeram o mesmo: foram vencidos pelo deadline, o prazo limite para o início de impressão. 

Dei uma geral nos grandes jornais do mundo; nem mesmo o New York Times disse nada. Não sei se por motivos ideológicos ou limitações próprias do meio. Talvez as duas coisas. No Brasil, todos os grandes jornais passaram batido. 

O único jornal a abordar o fato foi o chileno El Mercurio. Pelo menos que eu tenha visto na internet.  Com grande destaque na primeira página a chamada ocupou todo o espaço superior com texto e fotos de Fidel e seu irmão e sucessor Raúl Castro. 

Este é um comentário, um registro para dizer o quanto o impresso necessita se reciclar e lutar para manter-se como elemento essencial no processo informativo. 

Para tanto não pode falhar em momentos cruciais da história como falhou agora. É preciso haver o esforço. Somente isso justifica sua presença. 

O jornal impresso tem a condição documental que a TV e as redes sociais não abrigam. Assim, entendo que se o jornal não mais abarca os fatos perde-se a sua finalidade. O tempo midiático de hoje é bem diverso de há cinquenta anos. Então havia a justificação tecnológica para o atraso numa notícia. 

Hoje não. Com firmeza editorial o jornal pode sim acompanhar os fatos. e trazê-los a público.

Desta forma, urge a mobilização, o esforço. O trabalho para inserir-se no instante de mídia hoje vivido.

Não se justifica um jornal deixar pura e simplesmente de fazer um registro de tamanha importância. Rodar um segundo clichê, mesmo que com reduzida tiragem, seria importante. Não só para o jornal enquanto documento, mas, especialmente, para os leitores que o teriam nessa conta: um testemunhal, um testamento informativo, um documento, um marco. 

Mais que isso, um aliado atento e vigilante. Agregando-se a isso o poderio gráfico editorial, o tratamento que uma grande equipe de impresso pode dar a um fato de dimensões formidáveis. 

Mas, ao que parece, o impresso começa a desistir. Assim, ou dá início a alguma forma de jornalismo mais analítico-interpretativo ou não se justificará do ponto de vista de velocidade midiática a sua existência.

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Charles Tasnadi (AP)
Fidel, o tempo e a luta

A morte de Fidel é parte do período histórico que marca o esmaecimento do sonho cubano de uma sociedade socialista. A figura icônica do líder era sua expressão máxima.

A respeito do falecimento disse seu irmão Raúl Castro, segundo a edição online do El País: “Com profunda dor compareço aqui para informar ao nosso povo, aos amigos da nossa América e do mundo que hoje, 25 de novembro de 2016, às 10h29 da noite [1h29 de sábado, pelo horário de Brasília] faleceu o comandante em chefe da Revolução Cubana, Fidel Castro Ruz.”

Não se pode questionar o fato de que Cuba vive uma ditadura que se iniciou sob os princípios marxistas clássicos de ditadura do proletariado. E ditaduras não são boas. Mas julgo que também não se pode negar que aquela pequena ilha teve bravura suficiente para enfrentar os Estados Unidos, o grande inimigo que nas suas imediações ainda a ameaça sufocar com um ominoso embargo econômico.

Sem esquecer o ódio antigo, remanescente àquele dia 1º de janeiro de 1959, quando Fidel arrasou com o domínio de Fulgêncio Batista. E esse ódio explodiu com o ataque à Baía dos Porcos em 17 de abril de 1961 redundando num grotesco fracasso dos Estados Unidos, que armou cubanos dissidentes do regime cubano para tentar derrotar a ilha e fazê-la voltar ao seu controle. 

Fidel liderou pessoalmente a resistência e venceu: 176 agressores morreram, mais de 300 ficaram feridos e 50 resultaram incapacitados para toda a vida.

A presença do líder se avulta, inegavelmente, como estátua colossal a se opor ao imperialismo americano. Como todos os grandes estadistas reunia em si as controvérsias, paradoxos, perplexidades, paixões e dilemas tão típicos da condição humana. E tudo isso elevado a grande potência. 

Será preciso a passagem do tempo histórico, que é lento e profundo, para que se analise com vagar e acurácia a figura que acaba de partir. Ao que tudo indica os EUA começarão a influir novamente sobre os destinos de Cuba, e uma democracia ao estilo típico será implantada paulatinamente.

Espero que daqui a cinquenta anos não se venha a lamentar que apenas se trocou um tipo de sociedade autoritária por outra, que sutilmente induz o cidadão a se achar somente consumidor e leva o trabalhador a acreditar, ingenuamente, que está num plano mais elevado e acolhedor: não é mais trabalhador – é “colaborador”, é “associado” da loja em que trabalha. 

E tem gente que acredita.

sexta-feira, 25 de novembro de 2016

Alto empresariado e corrupção



“Meu filho, estude para ser ladrão.”

Para que tivesse potência e força brutais, a estonteante crise que domina o país teve nas entranhas onde foi gestada muito mais que a presença de agentes do estado – políticos de alto escalão e funcionários graúdos e desonestos.

Houve mais que isso, houve a presença e participação do grande empresariado nacional. Sem eles o descalabro não teria acontecido. Ou seria bem menor.
Mas isso, tal participação decisiva e vital, não é destacada nos noticiários: o fato de que foram eles, os grandes empresários – que agora estão repatriando seus dinheiros sujos antes entocados em bancos no exterior –, quem atuou de forma decisiva para levar o país ao descalabro.
Foi a fome do lucro desonesto, a ganância de tais pessoas que açulou os ânimos dos políticos e funcionários corruptos. Tudo isso deu no que deu: o país fazendo água, a tempestade perfeita. 

O que foi o triste espetáculo de Geddel Vieira Lima se não o retrato exato dos empresários corruptos e corruptores agindo junto ao governo? 
Mas a conta foi repassada ao povo, aos que literalmente gemem nos leitos de hospitais públicos, choram a morte de familiares atacados por bandidos ou lamentam a escola que o filho não tem. E a chibata vai estalar por vinte anos.
OK. Temer faz salamaleques para alcovitar o PSDB, seu aliado-verdugo, que dele vai se afastar no momento que melhor lhe aprover, até mesmo antes de 2018.
Ok. Temos um show, uma sociedade do espetáculo onde se encena o destino nacional.
OK. Aparentemente não temos a quem chamar para a salvação nacional.
OK. Mas o dia a realidade vai se impor. Não sei se com uma solução política pelo menos bem intencionada. O que temo é que nas ruas, onde muitos tomam vagas de idosos em estacionamento e funcionários públicos levam para casa papel resmas de papel da repartição, muitos estejam dizendo: “Quero ser como um deles. Quero ser ladrão. Meu filho, estude para ser ladrão!”
Imagem: https://www.google.com.br/search?q=bandidos+de+colarinho+branco&client=firefox-b&source=lnms&tbm=isch&sa=X&ved=0ahUKEwjX0uitl4rQAhXJFZAKHZnhDVMQ_AUICCgB&biw=1920&bih=922#imgrc=u7eFHNTuIkXJAM%3A

Geddel salta fora depois do estrago feito



Com apenas seis meses Temer já dirige um governo surrado


As redes sociais repercutem a demissão de Geddel Vieira Lima do cargo de ministro de Governo. Na verdade, ele não se demitiu: ele fugiu. E deixa atrás de si um presidente canhestro. Um tipo que, desde o início do seu, digamos, mandato, somente busca resolver problemas de uma matilha de políticos envolvidos em acusações de corrupção. Ele próprio um acusado. 
Caviloso, dúbio, buscando agradar a uma base aliada faminta por manter o país em seu estado natural de terra da corrupção, Temer agora caiu na própria armadilha de palavras à meia luz: conversas suas com o então ministro Marcelo Calero foram gravadas por aquele, dando conta das pressões que o então ministro da Cultura sofreu para atender a Geddel.
Temer não agiu como um estadista – seria exigir muito dele – mas sim como um alcoviteiro, um chalaça dos seus parceiros, um político vulgar e batido.

Agora tudo foi relatado por Calero à Polícia Federal que quer abrir inquérito para apurar se houve os crimes de concussão e advocacia administrativa. 

Concussão é o crime no qual funcionário público se utiliza do cargo para a obtenção de vantagem pessoal. Já a prática de advocacia administrativa refere o fato de servidor prevalecer-se do cargo para obter vantagens para outro.  

O inquilino do Palácio do Planalto e Geddel estão enovelados nesse labirinto. A demora de Geddel em fugir, a ação de Temer que pensou em acobertar um escândalo sem temer que esse fogo poderia voltar-se contra ele dão a dimensão do quadro: uma classe política com as vísceras expostas, mas que não se emenda nem percebe que os tempos estão mudados.
O procurador geral da República, Rodrigo Janot, estuda a possibilidade de incluir o presidente e o ministro Eliseu Padilha no pedido de inquérito apresentado ao Supremo Tribunal Federal.

Ao que parece, chegou a hora da verdade acrescentando-se a isso o fato de que vem aí a delação do fim do mundo, quando criminosos da empresa Norberto Odebrechet vão abrir as comportas e fazer revelações que devem abalar os alicerces dos mais poderosos políticos – pelo menos isso é o que se espera.
Com isso, Temer, que certamente pensava em voar em céu de brigadeiro para aprovar seus intentos de retirar direitos trabalhistas e previdenciários, terá, ao invés, tempestades dignas de figurar em qualquer filme de tsunami. 

Vamos ver como age o Supremo Tribunal Federal. Agora, com relação ao governo Temer, pode-se dizer: em seis meses já é um governo surrado. 

quinta-feira, 24 de novembro de 2016

Uma solução inesperada e terrível



Tem vizinhos barulhentos? Seus problemas acabaram: faça como eu, compre uma planta carnívora
Emanoel Barreto


U
m amigo encontrou-me certa vez em estado sorumbático e meditabundo. Quis saber o que eu tinha e expliquei que em meu bairro havia muita gente palradora, pessoas loquazes, barulhentas, festeiras e endiabradas por som alto.

"Só isso?", disse, e notei um certo ar de ironia com o meu sofrimento. "Só isso? Você chama de 'só isso' ao sofrimento de um cristão que não dorme há exatos seis meses?", repeli indignado. Ele respondeu que sim e bateu naquele bordão de certos comerciais de TV: "Pois saiba que seus problemas acabaram."

"Como?", eu disse.

"Simples: adquira imediatamente uma planta carnívora. Melhor que isso: nem gaste dinheiro. Vou lhe dar uma de presente" Eu mesmo solucionei essa questão com uma boa planta carnívora". E entregou-me uma adorável plantinha. Dei-lhe, apropriadamente, o nome de Jezebel. Ainda pensei em Lucrécia Bórgia mas desisti. Jezebel ficou sendo o nome. 

Então, algo estranho aconteceu. À noite, em vez do barulho de festas, passei a ouvir terríveis gritos, regougos desesperados, gemidos e coisas assim. Temeroso, passei a trancar com bastante cuidado portas e janelas.
Então, começaram a circular no bairro informações de que pessoas estavam desaparecidas. Coincidentemente, os mais aferrados festeiros. Liguei uma coisa à outra e concluí: "Jezebel. Só pode ser ela, a danadinha."

Não deu outra. Certa noite, ouvindo uma voz plangente, abri ligeiramente a janela e... Jezebel perseguia com firme decisão um velhote que morava em frente a mim e era doido por uma garrafa de uísque e tangos em alto volume. Ele corria em círculos e Jezebel ali: atrás do finório. 

Afinal, acuado, ele ia ser tragado quando interferi. Acalmei Jezebel e liberei o velhote. "Pelo amor de Deus, o que diabo é isso?", ele perguntou. Respondi: "Crime e castigo: Bbebeu e gritou Jezebel jantou."

Prometeu-me, jurou-me nunca mais me incomodar e no outro dia fugiu para um bairro bem distante. A foi assim, meu caro amigo, que resolvi todos os meus problemas com vizinhança barulhenta. Se você vive situação igual à minha, se tem problemas com barulhos noturnos, compre uma planta carnívora e seja feliz.

PS: Tenho mudas.  Mas, aviso logo: custam os olhos da cara.